Bárbara,
Na noite em que nos encontramos, dormi
com o seu cheiro no meu corpo. Acordei, na manhã seguinte, encantado com o
sabor de todos os seus fluidos. Ainda estirado na cama, no quarto de paredes azuis e
brancas semelhante a uma biblioteca com pilhas de livros acumulados feito verdadeiros edifícios, beijei os
dedos que antes estiveram dentro de você.
Em seguida, deslizei os mesmos dedos sob a bermuda até encontrar, já desperto, o
meu próprio sexo.
Quando você abriu a porta para me
receber em sua casa, me senti, imediatamente, como um menino diante do mundo. A voz afinou. Senti no ar toda a sua grandiosidade composta de fogo e ventania, fragmentada em átomos, partículas invisíveis a olho nu. Foi como se um raio, de repente, me partisse ao meio.
Além de um puta tesão.
Além de um puta tesão.
Seu corpo é lindo e
é lindo porque é seu. Ele carrega em dobras, curvas, reentrâncias, seios,
pernas, pelos, montes e orifícios uma luminosidade que se expande
ilimitadamente através do universo. Mas nada me encanta tanto quanto os seus
olhos, doces e leves, porque eles são completamente cheios de amor pela vida - quase todas as formas com as quais é possível encená-la, pelo prazer, pela
imprevisibilidade.
A bem da verdade, me sinto grato por termos nos cruzado nessa vida já que em meu ceticismo deixei por um tempo de acreditar que pessoas como você existem. Luminosas, radiantes. Reais. Que desprendem de si uma espécie de poeira de estrela, feito purpurina. Não atravessam, despercebidas, a vida de alguém. Transbordam. Transgridem.
Penso no quanto poderíamos aprender
com o outro. Magia, misticismo, teatro, literatura. Talvez as nossas infinitas conversas cessem um
dia e fique a fração do que aprendemos nessa brevidade. Eu não vou saber a sua cor favorita, se você gosta de
Os Mutantes, Novos Baianos, Caetano, Gal, ou o último livro que você leu. Assim como você não saberá que Revolver é o meu disco preferido dos Beatles, o filme que me faz chorar todas as vezes ou ouvirá histórias desde as viagens na infância para o interior do Piauí, até as minhas reportagens do meio do rio amazonas à Duque de Caxias.
- Eu tenho medo de tudo que tire a
minha liberdade - disse você quando estávamos entrelaçados no seu quarto.
Já eu temo assustadoramente o que seja capaz de cruzar os meus limites, as fronteiras que mantenho entre mim e o resto do mundo como forma de autoproteção. Quem sabe nisso a gente
se entenda porque ambos queremos, a sua maneira, preservar o que entendemos por liberdade.
Não se assuste, por favor. Não sou ingênuo, impulsivo e passional. Não tenho a ilusão de acreditar que o ser humano é movido mais por sua suporta racionalidade que pelas paixões que mantêm, mas conheço a mim mesmo muitíssimo bem e o suficientemente para afirmar que eu não quero nada mais do que você queira oferecer.
Não se assuste, por favor. Não sou ingênuo, impulsivo e passional. Não tenho a ilusão de acreditar que o ser humano é movido mais por sua suporta racionalidade que pelas paixões que mantêm, mas conheço a mim mesmo muitíssimo bem e o suficientemente para afirmar que eu não quero nada mais do que você queira oferecer.
Um espasmo
me trouxe mais uma vez ao quarto de paredes azuis e brancas, recheado de prateleiras e livros
desalinhados sob a bancada. Recolhi a mão. O meu cheiro, ainda mais forte, agora sobrepunha-se ao
seu. Levantei da cama e segui em direção ao banheiro. Um corpo largo, sonolento, sério me encarou no espelho. Braços e pernas que habitavam o espaço do menino que, na noite anterior, explorava todo o mistério do planeta.
Olha, Bárbara, escrevo esta carta para que você não
se esqueça de mim e também para que eu nunca me esqueça de você.
Com carinho,
C.